Em tempos de empreendedorismo de palco, tenho que assumir que ouvir um puxado “business model” no meio de uma conversa, me criou uma certa preguiça. Todo esse papo de sensacionalizar gestão nunca caiu bem pra mim. Mas, sim! O estudo e a consolidação do modelo de negócio – na visão prática – é um ponto essencial pra gestão e o canvas, uma ferramenta que veio para ficar (e somar).
Modelos de negócios sempre existiram, apesar de não estarem necessariamente exaltados como acontece hoje. De maneira objetiva, pode-se dizer que o modelo de negócio é ” a explicação de como sua empresa funciona e cria valor. Há muitas definições que buscam explicar o que significa o termo, mas a essência resume-se em buscar entender como a empresa fará dinheiro, qual será ou é seu modelo de receita e como as várias áreas e processos de negócio se relacionam para atingir o objetivo de fazer com que a empresa funcione, gerando valor aos clientes” (Dornellas). É certo que qualquer empresa bem sucedida tem sua explicação de geração de valor clara – ou não certamente já não estaria no mercado.
Muitas vezes o modelo de geração de receita – como assinatura, software como serviço, audiência – é confundido como “modelo de negócio”. Modelo de geração de receita faz parte do modelo de negócio, mas não o define. Cada modelo de negócio é único – o modelo de geração de receita de intermediação, por exemplo, possuí inúmeros modelos de negócio com diferentes estratégias para geração de valor, como Airbnb e Kayak. Assim como há inúmeros sites, com diversos acessos ao dia, que ainda não conseguiram uma definição clara de seu modelo próprio de negócio – apesar de um grande sucesso em acessos permanecem sem rentabilidade e sem sustentabilidade para sua gestão.
A Xerox é um bom exemplo de uma empresa que soube inovar no seu modelo de negócio se reposicionando como uma empresa de serviços, e a Kodak, um mal exemplo. Líder e pioneira até mesmo na máquina digital, optou por não alterar seu modelo de negócio focado na impressão e revelação de filmes fotográficos. Ignorou a evolução do mercado e foi engolida por ele.
Diferente do que se pode acreditar, o modelo de negócio não busca substituir o plano de negócios da visão tradicional de gestão. Apesar de que, segundo Sahlman, professor de Harvard, desenvolver um plano de negócios aumenta em 60% a probabilidade de sucesso do empreendimento; mas para muitos gestores, na prática, um plano de negócios carece de velocidade, adaptabilidade e aplicabilidade no dia a dia.Por isso, o modelo e o plano de negócio são ferramentas complementares para o sucesso. Uma vez que o modelo de negócio é dinâmico e prático, o plano de negócio detalha formalmente e embasa as estratégias delineadas, importante tanto para gestão como para os investidores.
Hoje o que impulsionou a exaltação do conceito, foi a consolidação de um amigável e dinâmico canvas (inglês para tela), onde, a partir de determinados critérios, se pode questionar-rever-inovar as estratégiasdo negócio, acompanhando a velocidade do mercado e a necessidade de erro-acerto-aprendizado de cada empresa, para se manter competitiva. E grande parte desse movimento deve-se à Alexander Osterwalder (o pesquisador e autor) e Steve Blank (o veterano entusiasta).
Para Steve Blank acredita em três pontos chave para construir negócios: desenvolvimento de clientes, engenharia ágil e o uso do modelo de negócios. Em entrevista à Exame, Blank afirma que empreendedores devem usar mais tempo testando e falando com potenciais clientes do que desenvolvendo um plano de negócios, para ele “nenhum plano de negócios sobrevive ao primeiro contato com os clientes”. Empreendedor veterano do Vale do Silício, com quatro empresas de capital aberto e professor em Stanford, Berkeley e Columbia, Blank acredita que o plano de negócio por si só é uma ferramenta muito isolada onde é possível planejar o futuro, porém sem considerar o processo de aprendizagem e desenvolvimento dinâmico de empresas como startups. Para ele, “startups de sucesso passam rapidamente de fracasso em fracasso, adaptando, interagindo e melhorando as suas ideias à medida que aprendem com os clientes (…) essa idéia de busca através de fracassos ao invés de apenas sucessos nunca foi explicada ou ensinada”
Alexander Osterwalder é o co-autor do livro que virou febre no Brasil e no mundo, Business Model Generation. O livro nasceu de sua pesquisa para PhD na HEC Lausanne, na Suíça. Ao colocar online, ele foi considerado o Justin Bieber dos negócios (sério, foi a HSM que disse isso, não eu) quando diversas pessoas pelo mundo começaram a baixar sua tese ele percebeu que a grande demanda para uma ferramenta amigável, ágil e, além disso, inovadora para gestão. Segundo ele, “80% das pessoas usam SWOT. Nada contra SWOT, mas para mim, é como um canivete. O mais preocupante é que não temos a sofisticação para usar ferramentas de administração. Sem hesitar, utilizamos ferramentas de 1985 quando trabalhamos com estratégia e inovação.(…) Podemos dinamizar nossa tecnologia, experiência e conhecimento se usarmos ferramentas melhores em estratégia e inovação. Já usamos ferramentas no âmbito de operações. Ferramentas de cálculos, Sistemas Integrados de Gestão Empresarial… Mas em termos de estratégia e inovação, não temos boas ferramentas. Isso é um problema. Estratégia e inovação são difíceis. Se usarmos ferramentas obsoletas como SWOT será muito difícil lidar com os problemas complexos de hoje. Administração não é fácil, então por que usar ferramentas simplistas? Ferramentas simples são boas. Mas simplistas, não. Muitas empresas gastam fortunas com Pesquisa e Desenvolvimento com foco em produtos e tecnologia. Tudo bem, isso é importante. Mas quanto tempo, dinheiro e energia você gasta concebendo o modelo de negócio ideal para esses produtos e tecnologias? Existe um desequilíbrio. Não é que produtos e tecnologia não sejam importantes, mas não basta. Não bastava em 1958 e, com certeza, não basta hoje em dia.”
A proposta dele para uma nova ferramenta é o canvas.
Como o vídeo explica com mais detalhes, o canvas é uma tela esquemática com nove blocos, os quais Ostwerwalder também chama de clientes – “você deve conhecê-lo, uma vez que você conhece o cliente, você saberá quais problemas teremos que solucionar o que teremos que oferecer”. Pode se avaliar que o canvas se constituí de dois lados, um emocional com foco em criar e entregar valor par ao cliente e o lado racional que tem como foco aproveitar recursos disponíveis e de maneira eficiente.
A concepção do modelo também é feita de maneira diferente do um plano de negócios tradicional. Em primeiro lugar, deve-se conceber um problema e coletar informações para iniciar a geração de idéias/brainstorming com o time mais multidisciplinar possível. O objetivo é estimular criatividade e inovação, gerando o maior número de idéias, com as mais diversas percepções do problema – é aqui que cartazes e post-its entram em cena. Somente após esse momento é que é possível discutir e escolher possíveis soluções que se transformaram em hipóteses. O próximo passo é testar as hipóteses – a fase de Steve Blank considera crucial. Aí então, é o momento de pivot onde a partir dos testes de hipóteses, o modelo de negócio é alterado dinamicamente, considerando os erros-acertos para uma maior aprendizagem do problema e, por fim, gerar a inovação – bastante relacionado ao processo de design thinking.
Essencialmente, a inovação se dá em quatro aspectos principais: oferta, consumidores, processos ou canais de entrega. De acordo com o livro, os modelos de negócio podem ser classificados em cinco grandes grupos (apesar de únicos em cada grupo!). O primeiro padrão é um modelo desagregado, quando há mais do que um negócio e cada um gera seu valor em diferentes aspectos do canvas. Modelos desagreagados são muito desafiadores, tanto pela dificuldade de manter seu dinamismo como conseguir entregar valor para cada consumirdor – o caso da Lan que uniu o modelo de negócio para transportes internacionais, transporte de cargas e transporte de passageiros e não só obteve grandes resultados, como se tornou uma das principais players do mercado. A chave do sucesso do caso da Lan é a interação entre os modelos e é também esta a dificuldade principal ue torna o modelo desagregado desafiador.
O segundo padrão de modelo de negócios é o modelo de cauda longa. Nesse modelo o foco é mercado de nichos e o nome é homenagem ao livro incrível que abriu essa discussão lá em 2008. Neste modelo o foco é identificar um mercado em potencial pouco explorado, com características bastante específicas e com uma grande geração de valor – geralmennte são mercados menores com poucas quantidades, porém com rentabilidades superiores. (Logo, logo vira um post mais detalhado!). O terceiro seria modelo de negócio “isca e anzol”, como por exemplo impressoras onde você compra o aparelho, porém continua gastando com toner. A impressora é o anzol, mas você sempre precisará do toner para que possa continuar usando o produto.
As plataformas multilateriais são modelos que geram valor facilitando interação entre grupos e são extremamente fortes no momento e muitas vezes são indicados como as empresas que estão mudando a economia como conhecemos. “O Uber é considerado a maior empresa de táxi do mundo, mas não possui um único veículo em seu nome. Mídia mais popular do planeta, o Facebook não produz conteúdo. O Alibaba, varejista mais valioso do mercado, não conta com depósitos de mercadorias. E o Airbnb, maior provedor global de hospedagem, não é dono de um único quarto de hotel.” E por fim, os modelos de negócios abertos. Segundo Osterwalder, esse modelo “pode ser usado pelas empresas para criar e capturar valor mediante uma sistemática colaboração com parceiros externos. Isso pode acontecer “de fora para dentro” quando há exploração de idéias externas no interior da empresa; ou de “dentro para fora” quando se proporcionam a parceiros externos idéias ou ativos que não serão utilizados na empresa”. São modelos essencialmente frutos de colaboração.
Apesar de que a glamorização do empreedendorismo pode ter feito alguns termos caírem no uso comum e até serem desacreditados, acredito realmente que o Canvas como visão para Modelo de Negócio é uma nova ferramenta para estratégia, gestão e inovação. A posição de Ostewalder e Blank de que nossas ferramentas não evoluiram apesar de tantas mudanças no mercado e na maneira de viver a vida dos consumidores é inegável. E, em um terreno tão delicado como de gestão, precisamos de novos olhares e ferramentas que tornem a estratégia mais veloz, precisa e empática ao consumidor.
Ostewalder não parou por aí. Junto com seu time, ele lançou a Strategyzer – uma plataforma online a qual ele trabalha para se tornar o “SAP da estratégia”. Se sua tese, colocada online despretensiosamente já revolucionou a maneira que enxergamos gestão estratégica, sem dúvida ficaremos de olho para os próximos passos de sua startup.